Maryah C. em : Mulher Perdigueira somos todas nós

Fabrício Carpinejar é contemporâneo, adivinha o que pensamos. E fala nossa língua, ou melhor, escreve.
Por tudo isso foi o escolhido para figurar entre os prêmios do PhD na nossa promoção de aniversário de 3 anos aqui.
O sortudo ou sortuda que faturar o livro autografadíssimo mais o nosso kit inverno completinho vai super se identificar. A coletânea presente no título traz as melhores crônicas do autor sobre relacionamento, sentimento, amor...
Ninguém melhor do que ele mesmo para explicar sua obra! Vamos conferir.






Mulher Perdigueira
Por Fabrício Carpinejar (*)

Brigamos quando não desejamos brigar. Existe paz e amor. Não existe paz no amor. John Lennon errou a equação.

Por isso, decidi que agora vou planejar uma briga com a namorada. Agendar uma briga. Arrumar uma data mensal para o inferno dos berros, choro e insultos. É o dia da ofensa no lugar das pequenas e irritantes DRs.

Em vez de avisar que pretendemos nos acalmar e ajudar, que somente pretendíamos conversar na boa, assumiremos que é uma guerra desde a primeira palavra. Dará no mesmo ao querer e não querer discutir.

Não será fácil, vamos rir dispersivos no início, haverá a inclinação para comentar algo do trabalho ou cafungar o pescoço, sentiremos fome, dependeremos de concentração e orelhas fervendo. Mas vale o sacrifício, trata-se de uma catarse necessária para empobrecer os recalques.

Prefiro uma mulher que me ofenda tudo num dia do que uma mulher que me ofenda um pouco por dia. É melhor. Mais sadio. Menos insano.

Desde que os casais aceitem uma regra básica: não vale colher insultos durante o entrevero para cobrar depois.

Pode falar as maiores perversidades e mentiras nos 90 minutos do confronto, incluindo intervalo e troca de lado na cama (gritaria que não dura um jogo de futebol indica o fim do amor). Pode juntar suspeitas avulsas, perguntas ancestrais e rumores antigos. É uma promoção: só nome feio e ofensa de baixo calão. Até xingar a mãe é permitido.

A única exigência é respeitar o território da hostilidade, fazer um círculo de giz no espaço e no tempo e permanecer naquela roda. Nada sai do contexto. Não vale embrulhar salgados e impropérios para a manhã seguinte. Deve-se comer somente na festa da raiva. No instante da cólera. Com sangue quente.

O grande problema dos atritos domésticos é que o insulto de uma briga passa a ser transportado para a seguinte e para a seguinte. No fim das contas, a batalha é uma só que nunca terminou. Uma gripe mal-curada que gera a vontade de cuspir na próxima gripe.

Caso reunirmos uma noite para limpar o pulmão, cansaríamos de tossir e bufar. E o suspiro reencontraria a brisa e pediria para andar de mãos dadas com o beijo.

Feito esse passo, agora é o momento de lavar a honra do ciúme.

Pior do que ciúme é a falta de ciúme. A indiferença é uma doença muito mais grave. Alguém que não está aí para o que faz ou não faz, para onde vai e quando volta. De solidão, chega a do ventre que durou nove meses.

Tão cansativa essa mania de ser impessoal no relacionamento, de ser controlado, de procurar terapia para conter a loucura. Loucura é não poder exercer a loucura.

Permita que sua companhia seja temperamental, intensa, passional. As consequências são generosas. Ela suplicará o esquecimento com mimos, sexo e delicadeza. O perdão é sempre mais veemente do que o rancor.

Repare que no início do namoro todos são descolados, independentes, autônomos. Aceitam ménage à trois, swing e Chatroulette. Não caia, é disfarce, medo puro de desagradar.

Se minha namorada arde de desconfiança, agradeço. Surgirá a certeza de que se importa comigo.

A vontade é abraçá-la com orgulho e reconhecimento, como um aniversário secreto. Às vezes ela cumpre seu ciúme, às vezes ela satisfaz um capricho e atende minha expectativa de ciúme. O importante é que não falha.

Com uma mulher ciumenta ao lado nunca estaremos isolados, nunca estaremos tristes, nunca estaremos feios. Deixo que ela mexa em meu Orkut, deixo que ela leia meus e-mails e chamadas no celular, deixo que ela cheire as minhas camisas, deixo que ela veja meus canhotos e confira os cartões de crédito (com sua revisão, nem dependo de contador, é improvável um engano nas faturas).

Facilitarei o acesso às máquinas, devidamente abertas e ligadas em cima da mesa, e tomarei banho para não incomodar. No jantar, esclarecerei qualquer dúvida.

Perigoso é não responder e deixar a namorada imaginar. Entre a realidade e sua fantasia, mil vezes contar o desnecessário. Estarei em lucro. Não faço nem metade do que ela pressentiu.

* Escritor, autor de Canalha!


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