Eu não quero contar uma história, de Etaf Rum

 



"É natural ser assim. [...] Parece que você foi ferida por alguém em quem confiava, a quem confiava com segurança e bem-estar. Isso tem um impacto."


Yara conquistou um mundo, mas não a si mesma. Criada em uma família palestina conservadora e emocionalmente volátil no Brooklyn, Estados Unidos, Yara acreditava que finalmente seria livre ao se casar com Fadi, um encantador empresário. No começo, tudo parecia a realização de um sonho: ela concluiu uma graduação em Artes e conseguiu um bom emprego na faculdade local. Mas ainda precisava desempenhar o papel de esposa tradicional: cuidar da casa e de suas duas filhas em idade escolar, além de preparar o jantar para o marido todos os dias. Yara sabe que sua vida é mais recompensadora do que a de sua própria mãe, mas ela sente um profundo vazio, o qual não consegue explicar. 

"As relações familiares podem ser muito complexas. Mesmo a melhor família pode deixar cicatrizes naqueles que a amam. Esses relacionamentos têm uma influência poderosa sobre o adulto que somos."

Decide confrontar o passado para reescrever o próprio destino. Após perder a oportunidade de acompanhar uma viagem estudantil à Europa e reagir a uma provocação racista de uma colega de trabalho, ela é colocada em probação e obrigada a fazer sessões de terapia para se manter no emprego. Sua mãe culpa uma suposta maldição familiar pelos problemas que Yara enfrenta. Embora não acredite em antigas superstições, ela se sente cada vez mais inquieta com o aviso e com a possibilidade de repetir os mesmos erros de sua mãe. Assim, Yara vê seu mundo cuidadosamente construído desmoronar. Agora, para se salvar, ela precisa enfrentar a realidade de que as dificuldades de sua infância, que pensava ter deixado para trás, têm implicações reais e prejudiciais não apenas para seu próprio futuro, mas também para o das suas filhas.


"O trauma, em nossa infância, pode fazer com que nossas emoções, mesmo quando adultos, pareçam muito desorganizadas. Às vezes é incompreensível para nós por que reagimos da maneira que reagimos..."

"Enquanto ele continuasse vivendo dessa forma, correndo desesperadamente de uma conquista para outra em um esforço para progredir, sempre haveria um novo objetivo em sua vida para distraí-lo."


Yara é uma pessoa visivelmente depressiva, mas que foi criada dentro de uma cultura que se sentir vulnerável era considerado uma loucura. Ela se vê sozinha em meio à uma vida que não escolheu para si, e por ser viver em um país com uma cultura completamente diferente da cultura de sua família, acaba se sentindo culpada por desejar ser dona de sua própria vida, sem submissões.

A narrativa do livro pode parecer monótoma, mas talvez seja exatamente esse sentimento que a autora desejava transmitir para o leitor: o mesmo que Yara sentia em relação a sua vida, justificando assim o seu desejo quase desesperador de mudar. 

Achei que este livro foi enviado à mim em uma boa hora. Em um momento em que muitas vezes me deparei com a solidão como minha principal companhia. Em muitos momentos que me questionei se viver no vicio da rotina é saudável para o nosso psicológico. De como hoje em dia as pessoas deixam de olhar mais para si porque viciaram em olhar para uma tela, seja ela uma TV ou um celular. 

“Eles tentaram nos enterrar, […] mas não sabiam que somos sementes”

Me fez reparar tbm o quanto somos adestradas a achar que somos ingratas quando sentimos que algo está errado em nossa vida, só porque a rotina está devidamente encaminhada. O quanto as vezes é difícil expressar nossas dores sem parecer que estamos reclamando de barriga cheia. 

Me arrisco a dizer que se esse livro não é uma obra autobiográfica, há pelo menos diversas referências da própria vida da autora. Porque ele é escrito de uma forma tão fiel as sensações e sentimentos que só que passou por tais situações abordadas consegue se aprofundar com tamanha maestria. 

Realmente não é um livro que conta uma história. Ele fala sobre sentir.

Outros quotes incríveis desta obra:

"De que adianta trabalhar para o futuro se isso significa esquecer de viver?"

"Ela pensa que é um homem, ou algo assim."

"Entregar-se à vulnerabilidade do amor e deixar-se amar pelos outros não é o ato mais corajoso de todos?"


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