Iatan GM: Violence


Foi despretensiosa a maneira com a qual se conheceram. Um chá, numa tarde de domingo, na praça mais movimentada da cidade. Ela veio com o telefone no ouvido, sussurrando suas chateações para alguém que estava do outro lado da linha. Desatenta ao que estava ao seu redor. Ao avistar uma mesa aparentemente vazia puxou uma cadeira e então se sentou.
Como já mencionado, a mesa estava aparentemente vazia. Do outro lado dessa pequena mesa quadrada um rapaz a encarou. Os olhos negros fitavam cada detalhe da moça loira que havia sentado a sua frente. Não reclamou, esperou que ela desligasse o telefone. Era diferente da maioria das moças que estavam ali, isso devido ao fato de que sua beleza não a dava uma aparência de mulher frágil.
Ele era alto e forte. A barba o deixava rude na medida certa, com um rosto que seria completamente perfeito, se não fosse uma cicatriz que descia do seu olho direito. Um perfume marcante, desconhecido.
Ele sorriu quando ela desligou o telefone.
Ambos sentiram que dessa vez seria diferente, e não sentiram errado. Tudo foi diferente só que não da maneira que imaginaram. Ela se desculpou por ter sentado sem pedir na mesa que ele estava ocupando, ele disse que não era problema, pois adoraria desfrutar da sua companhia.
Os fatos ocorridos em seu passado dificilmente permitiriam que ela se tornasse dependente de amor por algum homem. Mas ele era aquele que ela pensava que nunca iria encontrar: o homem pelo qual ela se apaixonaria.

Melissa teve uma infância bastante difícil, convivia com os abusos do padrasto, ciente das infidelidades e da violência que cometia rotineiramente. Cansou de ver sua mãe agredida, humilhada, sempre implorando e se mostrando dependente do marido. Aos dezesseis viu que não aguentava mais. Estava a sós com o pai bêbado, que tentou abusar dela outra uma vez.
O que aconteceu nesse dia pode ter sido azar, coincidência do destino, ou apenas uma péssima escolha do homem rico e gordo que abusava de mulheres.
Definitivamente esse não era um bom dia para se tentar ter relações sexuais na cozinha com a enteada. Ele baixou as calças e ordenou que ela lhe desse prazer. Então sem pena, sem remorso algum, ela agarrou a maior faca que viu e enfiou no pescoço do marido de sua mãe. Não lembrava quantas vezes repetira o movimento, estava se guiando pelos gritos agonizados do velho, seu alívio aumentava à medida que eles diminuíam, e quando ele se silenciou por completo ela percebeu que tinha concluído o que começou a fazer. Foi o fim de uma série de abusos que já vinham acontecendo por anos.
O prazer foi todo dela.
Fugiu de casa sem dar explicações. Só Deus sabe como ela conseguiu sobreviver. Prostituição, roubos, favores. Até que encontrou uma maneira de manter-se viva: seduzindo homens, tomado todos os bens que eles tinham e em seguida matando-os. Tornou-se uma golpista fina, conseguiu seu lugar no alto escalão da sociedade, porém ela conseguia manter-se discreta em relação ao que fazia.
Vez por outra se sentia mal por matar homens. Matar pais de família. Mas sentia prazer ao matar quando via que na hora da morte eles imploravam pelas suas vidas apenas pelo medo da morte, e sequer mencionavam que a maior razão para estarem vivos deveriam ser suas esposas e filhos.

Eles saíram durante algumas semanas. No primeiro encontro oficial ele a levou para um restaurante tão fino quanto o que haviam se conhecido. Ele mantinha sua postura máscula, sua barba bem cuidada e um perfume forte, porém doce e agradável. Ele lembrava alguém que ela já conhecera no passado, mas não fazia ideia de quem fosse. Presenteou-a com um buquê de rosas brancas, sem espinhos, “para não machucar”, ele disse. Ela já havia recebido flores de diversos homens, mas dessa vez foi diferente. O presente veio sem malicia aparente.
Meses se passaram, mas eles não haviam contado um ao outro algo que ambos deveriam saber. Ela matava homens que traiam suas respectivas mulheres. Ele era um matador de aluguel e sua única regra era matar apenas assassinos. Ou assassinas.
A relação de ambos talvez tenha se prolongado mais do que devia, até enfim ser conduzida ao seu final trágico.
Certa noite ele a convidou para sua casa, ela nem pensou em recusar. A casa era razoavelmente grande, bem distanciada dos vizinhos. Ao chegar à porta hesitou, mas tinha percorrido um caminho logo, não iria dar para trás.
Amaram um ao outro como um casal em sua lua de mel. Por horas a fio, atravessando a madrugada. Ele a beijava, massageava, acariciava.
Melissa adormeceu na cama ao lado dele.
Sem saber ao certo quanto tempo se passara ela acordou bruscamente. Não conseguia identificar se era dia ou noite. Ele a segurava pelo pescoço, pressionando suas jugulares. Ela não tentava reagir, apenas o encarava como se a recusa de uma reação fosse fazer com que ele recuasse.
Tal foi sua surpresa ao vê-la ali, imóvel. Não implorava por sua vida. Ele sentiu-se frustrado, uma vez que a melhor parte do seu trabalho era ouvir suas vitimas aos gritos implorando pela vida.
Ele a jogou no chão, sua cabeça bateu com violência, em seguida pegou o abajur que estava no criado mudo e atirou para cima. O espelho ficou rachado e o objeto caiu a poucos centímetros da cabeça dela. Viu seu estado refletido no espelho quebrado no teto, ela sabia que estava perto do fim.
Chegou mais perto dela com um papel na mão. Ficou de joelhos ao seu lado e mostrou o que segurava: uma foto dela ao lado de Fernandez (um dos infiéis que havia matado há algum tempo). Melissa não sabia da existência daquela foto e muito menos como fora para na mão dele. Ele a beijou pela ultima vez. Talvez, pra ela, essa fosse a dose de morfina necessária para não mais sentir dor. Então ele tornou a apertar o pescoço dela, que não aguentou mais por muito tempo.
Olhou pela última vez no fundo dos olhos dele e viu a malicia de seu padrasto ali presente. Ela sentiu o cheiro das rosas brancas. Um cheiro de rosas misturadas com seu próprio sangue. Por tantos anos evitou esse sentimento, e na única vez que resolveu se render completamente a ele, pagou por tudo de errado que vinha fazendo na sua vida, sofreu as consequências que sempre imaginou que iria sofrer.




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